(O grito - Edward Munch)
Constelações Familiares em Casos de Psicose
Texto de Gunthard Weber e Diana Drexler
1. Sobre a teoria e a técnica do
trabalho sistêmico com constelações
O trabalho com constelações
familiares é um procedimento psicoterapêutico relativamente recente e
controvertido. Ainda menos numerosas são até agora as experiências realizadas
por meio dessa abordagem com pessoas que exibem comportamento psicótico. Tais
experiências, contudo, são animadoras a ponto de justificar nosso relato a seu
respeito. Dispensamos-nos aqui de apresentar os princípios que fundamentam esse
trabalho, ("ordens do amor", consciência pessoal e consciência do
grupo familiar, etc). Apresentamos apenas uma breve introdução, dedicando maior
atenção aos aspectos que nesse trabalho com pacientes com diagnósticos de
psicose nos aparecem como especialmente importantes.
1.1 O desenvolvimento do trabalho
com constelações familiares
A técnica das constelações
familiares foi desenvolvida em seus elementos básicos por Bert Hellinger,
sobretudo nos anos 80. Desenvolveu-se e expandiu-se rapidamente no espaço
cultural de língua alemã e, nos últimos anos, também em escala internacional.
Tem suas raízes na abordagem da terapia familiar através de várias gerações.
Abordagens da terapia familiar orientadas para o crescimento já utilizavam há
mais tempo representações espaciais para entender constelações de
relacionamentos e para estimular modificações. Depois que Bert Hellinger entrou
em contato com representantes da terapia familiar, nos Estados Unidos, e com o
trabalho de escultura familiar, na Alemanha, ele começou a condensar insights
sobre a dinâmica familiar, - sobretudo os que tinham caráter estrutural e
envolviam várias gerações - com procedimentos da análise transacional, numa
terapia breve de grupo, sob a condução de um diretor. Essa terapia ele
denominou "Familien-Stellen" (método de "colocar" ou de
"constelar" famílias). Esse trabalho era complementado, nas assim
chamadas "rodadas", por intervenções hipnoterapêuticas ou outras, de
que se valia Hellinger, através do humor, da confrontação ou da narração de
histórias para quebrar padrões rotineiros de pensamento e estimular novas
alternativas de ação. Infelizmente, essa técnica de rodadas, onde os
participantes relatavam, cada um por seu turno, seus sentimentos e suas
questões, teve de ser abandonada quando Bert Hellinger passou a trabalhar com
grupos muito numerosos.
1.2 Compreensão do sistema e dos
sintomas
Numa constelação são levados em
conta todos os membros de um sistema familiar no âmbito de três gerações, de
maneira a incluir os vivos e os mortos. Todos os membros da família tomam parte
numa ordem básica à qual estão permanentemente vinculados. Essa ordem básica
inclui, por exemplo, o direito de todos a pertencer ao sistema e a precedência
dos que vêm antes sobre os que vêm depois. As famílias onde os sintomas
aparecem estão frequentemente em "desordem" no que toca a essas leis.
Os sintomas que estejam
condicionados por implicações sistêmicas sistêmicas manifestam a existência de
um profundo amor resultante do vínculo, uma ligação inconsciente do indivíduo
com seu grupo de origem. Isto faz com que alguns repitam os destinos de outros
e queiram, em lugar deles, assumir algo de pesado, expiar ou até mesmo morrer.
Tal necessidade de compensar se radica num pensamento mágico de caráter
infantil, já que tal atitude não tem o poder de redimir essas pessoas nem de
aliviar ou de anular seus destinos. Outra base para o desenvolvimento de
problemas é a perda de conexão com as fontes dos laços familiares. Isto
acontece, por exemplo, quando membros da família não são respeitados ou são
esquecidos. Além da implicação sistêmica, devem ser ainda considerados, na
geração de dificuldades psíquicas, os aspectos associados à evolução pessoal,
por exemplo, a interrupção do movimento precoce da criança, dirigido geralmente
para a mãe. No presente trabalho focalizamos preferencialmente as dinâmicas
sistêmicas, dando menos espaço ao significado da história individual da vida e
do processo da aprendizagem.
1.3 O processo da constelação
Em nossos seminários, que duram
de dois dias e meio a quatro dias, trabalhamos com grupos de 12 a 14
participantes e com um máximo de 10 observadores participantes. Na constelação
familiar cada participante do grupo monta espacialmente sua imagem interna de
um dos seus sistemas (o de sua família de origem ou da atual, ou ainda de suas
relações de trabalho), com a ajuda de representantes, escolhidos entre os
integrantes do grupo. Esses representantes geralmente possuem pouquíssimas
informações prévias sobre as circunstâncias da vida e da história das pessoas
representadas. O terapeuta interroga os representantes sobre suas sensações e
sentimentos nos lugares que ocupam. As percepções dos representantes fornecem
indicações importantes sobre as dinâmicas familiares e as conexões sistêmicas,
pois é incrível como refletem exatamente, muitas vezes, as pessoas
representadas, que não são conhecidas pelos representantes. O dirigente do
grupo tenta a seguir mudanças de posição para os interessados, buscando, na medida
do possível, o "melhor" lugar para cada um do sistema. Quando se
consegue isto, o terapeuta geralmente introduz o próprio cliente em seu lugar
(até então ocupado por seu representante). Em conexão com determinadas frases
que diz às pessoas importantes de suas relações, ele muitas vezes experimenta
de novo uma dor antiga e emoções que aliviam, e ganha novas perspectivas. A
"imagem da solução", quando ele a consegue acolher e interiorizar,
desenvolve nele frequentemente efeitos que perduram por longo tempo.
1.4 A inserção da constelação
familiar no processo terapêutico
Evolução progressiva ou
experiência de iluminação?
A forte expansão do trabalho com
constelações tem despertado junto ao público, de um lado, expectativas fora da
realidade e, de outro, críticas de simplificação sem seriedade. De acordo com
nossas experiências, o trabalho da constelação familiar, justamente com
pacientes que exibem comportamento psicótico, só se recomenda no contexto de
uma relação terapêutica e com uma acurada preparação. Os pacientes se inscrevem
para os seminários de forma autônoma e sob a própria responsabilidade, mas
geralmente são advertidos dessa possibilidade por seus terapeutas, que
frequentemente também os acompanham nos seminários. Não devem apresentar
sintomas psicóticos agudos. Muitos pacientes comparecem inicialmente a
seminários, uma vez ou várias, como observadores participantes, não fazendo
inicialmente suas próprias constelações mas presenciando as de outros ou delas
participando como representantes. Os terapeutas que lhes recomendam o trabalho
ou os acompanham nele deveriam conhecer o trabalho com as constelações e suas premissas,
e o terapeuta que conduz a constelação deveria ter experiência com pacientes
desses grupos de diagnóstico. Em seguimento a uma constelação familiar podem
eventualmente surgir no paciente reações depreciadoras ou agressivas e até
mesmo episódios psicóticos. Tais reações, que inicialmente interpretávamos como
sinal de insucesso, hoje encaramos como medidas distanciadoras, que visam
restabelecer a autonomia do paciente para poder lidar com o intenso desejo de
estar próximo e de ser olhado, que se reavivou nesses seminários e foi
satisfeito apenas por um curto período de tempo. Ultimamente, justamente em
seguida a tais "pioras", temos recebido com frequência excelentes
retornos de terapeutas relatando desenvolvimentos positivos depois de constelações
familiares.
2. Elementos terapêuticos do
trabalho com constelações familiares
2.1 Esclarecimento da solicitação
Um fator importante do seminário
de constelações é o esclarecimento do que se deseja do terapeuta. Quanto mais
concretamente forem formuladas as questões e os objetivos, tanto melhor se
poderá decidir qual corte do sistema deverá ser representado ou levado em
consideração. A ampla dispensa de uma anamnese detalhada e o enfoque dirigido
para soluções e recursos choca-se, às vezes com resistências, justamente por
parte de pacientes com longa história de tratamento, como se estes tivessem de
"defender" seu status de doentes e justificar seus problemas.
Contudo, se os pacientes com diagnósticos de psicose recebem nos seminários o
mesmo tratamento como todos os demais, eles logo mostram, muitas vezes,
incríveis habilidades sociais e geralmente se integram em problemas ao grupo.
2.2 A representação
O que se exige dos representantes
nas constelações é que se desprendam em larga medida de suas histórias
pessoais, que percebam "sem intenções" e comuniquem as reações
corporais, sentimentos ou sensações que emergem nos lugares que ocupam como
representantes. Esta exigência de deixar "de fora" a própria história
e as hipóteses de uma psicologia corriqueira (por exemplo, "Aquela pessoa
está longe de mim - com ela não devo ter muito a ver"), e de se entregar
sem reservas ao que se sente, oferece a cada participante um exercício de
percepção que no decurso do seminário vai sendo cada vez melhor dominado. Tem-nos
surpreendido, repetidas vezes, a maneira diferenciada e sensível que exibem,
como representantes, pacientes que antes apresentavam um comportamento
psicótico. Alguns ainda precisam de uma ajuda inicial, tanto para entrarem num
papel quanto para se "despedirem" dele, mas muitos vão apreciando
cada vez mais a possibilidade de vivenciar papéis e lugares totalmente
diferentes nas famílias. Numa constelação é possível perceber onde esses
pacientes frequentemente encontram problemas: em viver relações intensas e em
seguida voltar a si mesmos (quando, depois de uma constelação, abandonam os
papéis que representavam).
2.3 A vivência da imagem
Através do método de posicionar
membros da família, com a ajuda de representantes, manifesta-se um aspecto
vivencial que, à exceção do trabalho com esculturas familiares, raramente
aparece em outras abordagens terapêuticas: a experiência subjetiva direta,
realizada simultaneamente em muitos canais sensórios, envolvendo o lado
fisiológico, o expressivo-motor, o emocional e então também o cognitivo.
Através dessa experiência direta que envolve o corpo e os sentidos, as imagens
consteladas têm muitas vezes fortes efeitos emocionais e com isto podem ser
revividas e trabalhadas. O que se procura, em termos de imagem sensível, é um
lugar melhor para o protagonista. As mudanças nas sensações corporais e nas
emoções dos representantes e do próprio cliente servem de instrumentos para
validar a solução. Na imagem da solução ganham um lugar informações e pessoas
até então excluídas. Quando o processo da constelação, com a imagem da solução,
é significativo para o cliente, ele ativa novas formas de ver e de proceder em
constelações familiares até então experimentadas como problemáticas. Como num
rito de passagem, os passos individuais (as imagens intermediárias) são
condensados numa experiência que se pode apreender e compreender.
3. Experiências já resultantes do
trabalho de constelações com pessoas com diagnóstico de psicose
Em contraposição às teorias e
procedimentos de abordagens terapêuticas estabelecidas, exaustivamente
formuladas e diferenciadas através de decênios, o trabalho com constelações,
especialmente com pacientes de psicoses, só apresenta algumas experiências
iniciais. Essas experiências indicam que determinados padrões de relacionamento
e determinadas dinâmicas sistêmicas aparecem mais frequentemente em sistemas
com pacientes de psicose do que em outros sistemas. Isto não implica em afirmar
que esses padrões estejam condicionando o aparecimento de psicoses. Entretanto,
podemos verificar que processo de trazê-los à luz e resolvê-los através das
constelações frequentemente influencia positivamente e de forma duradoura o
comportamento dos envolvidos.
Descrevemos a seguir algumas
dessas características e dinâmicas de relacionamento em pacientes com diagnoses
de formas esquizofrênicas, inclusive alguns exemplos de casos.
3.1 Fragilidade na diferenciação entre o
"eu" e os "outros".
Nestas constelações, com mais
frequência e de modo mais drástico do que em outras, os representantes
expressam percepções que, num sentido mais amplo, se relacionam ao tema da
"diferenciação entre si mesmo e outras pessoas no sistema". Os representantes
se confundem com outros, sentem-se enredados e ligados como se fossem siameses
e carecem de um espaço próprio perceptível; ou então se sentem colocados
inteiramente diante do sistema ou para fora dele. Exprimem-se com marcada
ambivalência, oscilam entre sentimentos de estarem fundidos, amarrados e
obrigados, desejando ter autonomia e espaço livre, ou então se apresentam
desorientados, desesperados ou mudos. Estas manifestações de participantes
"ingênuos" do curso em posições de representantes correspondem às descrições
da dinâmica psíquica nas abordagens da terapia individual. Nas constelações
pode-se mostrar com frequência que esses estados psíquicos perturbadores,
opacos e quase insuportavelmente contraditórios possuem o seu equivalente em
acontecimentos e processos relacionais obscuros, traumáticos e cercados de
segredos do sistema familiar, em que os interessados estão implicados de forma
muitas vezes inconsciente. Trata-se aí de dinâmicas que atuam através de
gerações. Nas constelações, o comportamento psicótico se manifesta como um
esforço ativo para dominar inconciliáveis tensões e oposições, de caráter
interpessoal e intrapsíquico.
3.2 Ligação profunda e identificação
Denominamos
"identificada" uma pessoa que, de modo inconsciente, está implicada
com aspectos de um ou de vários membros da família e tenta imitar ou superar
aspectos da vida dele(s). Segundo nossa experiência, tais identificações surgem
principalmente quando membros do sistema tiveram um destino especial, ou quando
não são respeitados ou foram excluídos. Membros que se seguem no sistema
familiar caem então em contextos de relacionamento em que muitas vezes, de
forma inconsciente, repetem aspectos do destino dessa(s) pessoa(s) ou sentem a
necessidade de resolver algo em seu lugar. Em famílias com formações
sintomáticas esquizofrênicas, encontramos frequentemente formas especiais de
identificação que descrevemos a seguir.
3.2.1 Identificação transsexual
Exemplo 1:
A mais velha de duas filhas
desenvolvera um comportamento psicótico ao terminar seus estudos superiores.
Apaixonara-se por um de seus professores, mas também não estava certa de que
ela própria não fosse um homem, e durante semanas apresentou-se em suas aulas
com trajes masculinos. Jamais conseguira trabalhar em sua profissão. Na
constelação, sua representante se postou ao lado da mãe e o pai afirmou que não
tinha nada a ver com aquilo. Através de perguntas apurou-se que a mãe tivera um
noivo e que o casamento fora impedido pelas injunções da guerra. Durante toda a
sua vida, ela rejeitara seu marido, desvalorizando-o em presença das filhas e
também idealizando o noivo por sua melhor instrução. A cliente tinha cursara a
mesma disciplina do antigo noivo da mãe e, como ela própria dizia, tomara o
lugar dele junto da mãe.
Ela se sentiu liberada quando o
noivo foi introduzido na constelação e quando ela disse, tanto a ele quanto à
sua mãe, que nada tinha a ver com ele e que só queria viver a própria vida e
aceitar-se plenamente como mulher. Em seguida colocou-se junto do pai e disse-lhe
que ele era o responsável pela mãe.
Exemplo 2:
Um paciente, que vinha sendo
diagnosticado como doente psíquico crônico e que fora criado num círculo de
muitas mulheres, após um seminário assumiu-se abertamente como homossexual. A
partir daí passou a mostrar sintomas bem mais raramente, completou com
acompanhamento terapêutico uma exigente formação e há dois anos exerce sua
profissão.
3.2.2 Identificações duplas
Particularmente pesada é a
identificação simultânea com dois excluídos. Uma forma especial dela é a
identificação simultânea com vítima(s) e autor(es).
Um exemplo:
Uma participante de um seminário,
de cerca de 50 anos, com uma carreira psiquiátrica de muitos anos, tinha um pai
de mãe solteira, que entrou na polícia especial nazista e mais tarde foi vigia
num campo de concentração. Através de perguntas, apurou-se durante a
constelação que o pai dele era judeu e que nada se sabia sobre seu destino. Com
isto a paciente passou a compreender melhor seus sintomas, que já duravam anos,
de ser simultaneamente simultaneamente perseguida e perseguidora. Essa dinâmica
foi por nós encontrada diversas vezes, por exemplo, nos chamados doentes
mentais transgressores. Seja frisado, neste contexto, que com muita frequência
tomamos à letra conteúdos de manias, que se revelam carregados de sentido. Se
alguém se sente perseguido ou envenenado, perguntamos: quem na família foi
perseguido ou envenenado? Ou, se alguém sente compulsão de lavar-se,
perguntamos: quem na família precisava lavar-se? Não dispomos aqui do espaço
necessário para entrar mais fundo nesta matéria.
3.3 Segredos e tabus
Em constelações de pacientes de
psicoses pudemos verificar repetidas vezes que provocavam perturbação nesses
pacientes relacionamentos confusos e mal definidos, como paternidade obscura,
adoções mantidas em segredo, ocultação de um irmão gêmeo que morreu no parto ou
durante a gravidez, causas de morte obscuras ou ocultadas (por exemplo, um
suicídio apresentado como um acidente). Devido a sentimentos de lealdade, os
pacientes frequentemente não se atrevem a comunicar as incertezas que
experimentam, fazer perguntas sobre elas ou investigá-las.
3.4 Sequelas de culpa e de
violência na família
Em famílias onde há psicoses
parece também haver um número bem maior de segredos de família e de tabus
relacionados com atos de violência, crimes e injustiças de que participaram,
como autores ou como vítimas, membros da família (geralmente de gerações
precedentes). A culpa cometida ou experimentada geralmente não era encarada nem
exteriorizada.
Ilustro com um exemplo de um
seminário de constelações familiares:
Um homem de 33 anos, após uma
grave tentativa de suicídio, procurou-me para uma terapia. Contou que nos
últimos meses, quando estava se separando de sua namorada, retraiu-se de todo
contato social e desenvolveu fantasias de perseguido e de perseguidor. Finalmente
abriu a própria veia jugular e só foi salvo devido a circunstâncias felizes. Na
época do início da terapia não mostrava sintomas psicóticos agudos, mas todos
os sinais de uma grave crise de identidade e de autovalorização. Estava
fortemente deprimido e padecia de sentimentos massivos de culpa, insuficiência
e fracasso. Experimentava uma forte diminuição de seus impulsos e um
retardamento motor, falava por monossílabos e estava grandemente limitado em
sua expressão. Durante um ano de acompanhamento psicoterapêutico aconteceram
vários episódios de crise e conversas em família com o pai e o irmão mais novo,
que sempre exprimiam medo de uma recaída e pela vida dele. Ele se estabilizou,
mas voltou a viver com os pais e cortou quase todo contato com o mundo exterior.
Ele mesmo se queixava de falta de acesso emocional a si mesmo e à tentativa de
suicídio, experimentava-se como se estivesse cortado de alguma coisa e não
"sentisse" mais a si mesmo.
Sua participação num seminário de
constelações familiares tinha o objetivo principal de retomar contato com
outros (interessados). No decurso do seminário ele constelou sua família de
origem (os pais, ele próprio e um irmão mais novo). Os representantes de todos
eles disseram que tinham pouco contato com os próprios sentimentos. Como o
representante do pai, na constelação da família, se virou e olhava para fora,
interrogamos o cliente sobre destinos ou acontecimentos especiais em sua
família de origem. Apuramos que dois de seus irmãos tombaram na guerra e que
seu avô voltara para casa ferido por um tiro na barriga. Fizemos com que o
cliente incluísse na constelação os dois tios e o avô. Ele reverenciou cada um
deles. Os representantes dos tios se sentiram olhados e honrados em seu
destino, mas o representante do avô disse que não se devia reverenciá-lo pois
cometera algo muito grave. Paralelamente já se tinham modificado antes os
sentimentos dos demais representantes da família, de forma incomum e dramática.
Todos eles se afastaram do representante do avô e mostravam um forte medo.
Respondendo às perguntas, o cliente só pôde informar que o avô tinha sido um
participante entusiasta da guerra. Experimentalmente foram então introduzidos
representantes de vítimas da guerra, que se deitaram no chão. Sua presença
provocou no representante do cliente uma veemente compaixão, enquanto o
representante do avô permaneceu frio e distante. O representante do cliente se
inclinou diante das vítimas, despediu-se também do avô, que fora colocado à
parte da família, e deixou com ele a culpa. Em seguida foi colocado ao lado do
pai.
Depois da constelação o cliente
contou que da herança do pai ele tinha pedido para si a mochila de guerra (na
ocasião, tinha sete anos). Essa mochila continha, entre outros objetos de uso,
o livro de Hitler "Mein Kampf" (Minha Luta) e uma velha pistola. Foi
com essa arma que ele tentou suicidar-se e só recorreu à faca quando a pistola
falhou. Foi profundamente tocante, para o cliente, sua vivência num grupo onde
nem ele nem seu avô foram moralmente julgados, e no qual ele, de forma
comovente, se dirigiu a seu pai e seu pai a ele. Por desejo próprio, ele
terminou a terapia, depois umas cinco sessões adicionais, separadas por
intervalos mais longos.
Dois anos depois, apareceu no
consultório do terapeuta com um ramo de flores nas mãos. Relatou que tinha
prestado com êxito seus exames finais como engenheiro, assumido um emprego e
iniciado uma nova relação. Sentia que tinha “aterrissado bem na vida”. Disse
que o seminário da constelação tinha sido a coisa mais difícil que conseguira
na vida, e que fora incrivelmente importante para ele.
3.5 Outros dilemas que pesam
Certas situações se tornam também
insustentáveis para tais pacientes quando, além das implicações sistêmicas, se
defrontam com vários dilemas de relacionamento. Podem estar colocados, por
exemplo, entre duas pessoas relacionadas que estejam em conflito total entre si
(por exemplo, seus pais ou a mãe e uma avó que também more em casa). Pode ser
ainda que alguém tenha colocado para eles expectativas comportamento totalmente
contraditórias e inconciliáveis, ou que várias pessoas ao mesmo tempo lhes
tenham colocado expectativas diferentes e estressantes.
Isto aconteceu, por exemplo, com
uma paciente simultaneamente identificada com agressora e vítima. Na constelação
ela ficou em posição transversa entre a representante da mãe e a da avó
paterna, que se odiavam mutuamente. Tais triangulações adicionais marcantes
dessas crianças foram frequentemente encontradas por nós nas constelações. Suas
soluções proporcionaram claros alívios adicionais. Quando os pais provinham de
países diferentes ou pertenciam a diferentes comunidades religiosas, isto
trazia aos filhos novos dilemas.
4. Conclusão
Requer-se uma grande experiência
terapêutica para se lidar cuidadosamente com as "informações"
reveladas nas constelações, tomando-as, sim, a sério, não porém excessivamente
à letra. Talvez mais do que em outros métodos, existe aqui, conforme a formação
e a mentalidade do praticante, o perigo da simplificação, de uma abreviação sem
seriedade e da manipulação. Além disto, cada família tem o direito de manter
seus segredos. Pode ser útil que, depois de uma constelação, familiares
acrescentem às percepções, até então tomadas como “loucas”, informações que
esclareçam os acontecimentos já registrados. Quando, porém, aquilo que emerge
nas constelações passa a ser considerado como a única verdade válida, a
confusão e as manias apenas ficam piores. Em nossa apreciação, o trabalho da
constelação familiar, com sua perspectiva sistêmica que abrange gerações e a
utilização da representação espacial, é uma complementação e um prolongamento
essencial do espectro terapêutico no tratamento de pessoas que exibem um
comportamento psicótico. Nossas experiências apoiam as tentativas de pessoas
versadas em assuntos psíquicos, no sentido de buscar um entendimento de seus
sintomas aparentemente incompreensíveis como "mensagens do mundo
interior". Nossa tendência é de interpretá-los, antes, como indicações de
implicações sistêmicas até então não compreendidas.
(Dom Quixote - Alucinações)
Citações
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Trabalho apresentado no 4o módulo do Treinamento Internacional de Terapia Sistêmica, Belo Horizonte, setembro de 2002. Tradução de Newton Queiroz
Sobre os autores:
Dr. Gunthard Weber - Médico Psiquiatra e Psicoterapeuta
http://www.gunthard-weber.de/
Dra. Diana Drexler - Psicoterapeuta
http://www.dianadrexler.de/
Muito bom!Parabéns!!! Obrigada.
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