Ilusões - Fantasias - Devaneios - Ficções - Expectativas...
"O psiquismo é o palco, por excelência, onde se encenam os dramas e tragédias da angústia humana." Sigmund Freud
"Expectativa é igual paçoca, do nada esfarela tudo” Poesia rotineira
A
verdade, na sabedoria popular, sobre expectativas...paçoca!
Li
esta bela metáfora no Instagram (@poesiarotineira) e a compartilho com
vocês...pois ela é muito verdadeira. Ou, ao menos toca em verdades. O que eu
vejo, ouço, sinto...na relação com o outro é real, ou são as minhas
expectativas projetadas, falando, ouvindo e sentindo? Eu "expecto" o
outro ou me relaciono com ele(a), tal qual ele(a) se mostra e É?
Claro...relações são a 2 (3,4,5)...ou seja...todos "expectamos"...a
dúvida é, nos relacionamos? Formamos laços, vínculos, trocas...reais...com
outro(a)? E conosco mesmo(a), me relaciono ou me "expecto" a mim
mesmo(a)? Vivo a vida, ou flutuo em uma bruma de ilusão?
“Ah
que bom seria se...e se ele(a) pudesse entender isto...que decepção que ele(a)
me causou...me olho no espelho e decepciono me com...se ao menos as
pessoas...seria tudo diferente se ele(a) ao menos...ele(a) me fez pensar
que...não acredito que fui tão idiota a ponto de cair nesta...se meus pais
fizessem diferente, teria sido...vou pedir a Deus que mude isto, pois só
assim...Eu não esperava isto de você...”...e tantos outros exemplos.
Conforme
me relaciono, me permito, me entrego, vivo a relação – sofro, me desnudo, me
fragilizo, fico vulnerável...cresço. Mas... “me disseram que a felicidade
era...deveria ser...poderia ser...porque naquela vez ele(a)....e tem aquela
história que contaram que era...”
Escolho
a verdade dura, as renúncias atreladas, as consequências e efeitos de meus atos
- a minha responsabilidade pelo que faço, vejo, sinto, escolho...ou...prefiro
“mentirinhas” confortáveis. Instantâneas, imediatas, imaginadas, queridas,
completas, perfeitas, construídas virtualmente na velocidade e facilidade de
um: Click (?!)
"As
massas nunca tiveram sede de verdade. Elas querem ilusões e não vivem sem
elas". Nesta afirmação de Sigmund Freud sobre as massas, o grupo
padronizado, uniformizado de pessoas, temos também o refúgio nas ilusões,
fantasias, falsas promessas, ideias simplistas e confortáveis. As ilusões têm
algo ao mesmo tempo de fugidio, rápido, simples...controlável. A ideia de que
posso ter, desfazer, terminar, deletar, dominar, sem muito esforço, sofrimentos
ou renúncias. O mundo da fantasia é um
mundo de prazer, possibilidades, vaidades e onipotência.
Quando
crianças, isto faz muito sentido. Tenho o mundo em minhas mãos. Há um adulto
cuidando do mundo, enquanto sonhamos e fantasiamos um dia sermos grandes. Por
vezes pensamos que será em um estalo de dedos. Ou tomando uma poção mágica. Ou
colocando os saltos e a maquiagem da mãe. Mas, na verdade, na realidade, há
adultos pagando o preço, as consequências, as responsabilidades, as renúncias,
para que as crianças possam ingenuamente e inocentemente permanecer em seu
pequeno mundo de ilusão e fantasia.
E
por este mundo de ilusão e fantasia, lentamente, vão adentrando na realidade.
Um adentrar que não ocorre sem certo sofrimento e luto. O adultecer tem este
preço. Percebo que aquilo que eu achava que era, não era bem assim. E aquilo
que não era bem assim ainda está longe de ser o que penso que é. As coisas
começam a receber uma amplitude, peso, consistência, valor, consequências. Dói.
Dói demais. Me escapa o tempo todo das mãos. Não consigo conter, manter,
encapsular. Tenho que (aprender) renunciar a formas de ver, perceber...de ser.
Tudo muda, o tempo todo...é difícil ter controle sobre as coisas fugidias,
evanescentes...que julguei eternas e fixas, permanentes em minha cabeça, em
minha imaginação.
Crio
o mundo à minha volta a partir de minha fantasia, desejos, pontos de vista,
conceitos (e pré conceitos), crenças...em grande parte envoltas em uma roupagem
de ilusão. Que o torna mais amigável, fácil, digerível, possível...na minha
medida!
Mas
não é! E isto me irrita. Isto me estorva. Me entendia. Me desanima. Me frustra.
Me entristece. Vem aquele vazio incômodo. Aquela sensação...o que estou fazendo
com minha vida? O que busco realmente nela...ou em mim? O que “eles” querem de
mim? Ou talvez o que eu
espero...expecto...faço e aconteço de mim, na vida?
“Desde
que a gente nasce a gente vive escravo da expectativa do Outro”, colocação do
psicanalista Jorge Forbes. Somos nomeados. Somos esperados. Há expectativas
sobre mim do papai, da mamãe, dos avós, do meio externo, da comunidade, de quem
nem conheço ou faço ideia – aliás nem ideia de mim mesmo tenho ainda, são os
outros que as tem e proferem: “Se for menino ele vai poder continuar o negócio
que meu pai criou, será a 3ª.geração no comando da empresa...Ela vai ser um
alento para nossa família, depois de tudo o que aconteceu...Já comprei a camisa
do time, ele vai ter o time do pai claro, e vou levar ele no estádio assim que
der...agora a irmã não vai se sentir tão sozinha, ela nos pediu tanto por um
irmãozinho...agora com esta criança nosso casamento vai ter mais
força...importante ter filhos para não ficar sozinho quando for velho(a)...” –
apenas para ilustrar alguns exemplos destas expectativas, discursos que nos
marcam antes mesmo de estarmos na realidade. E vou precisar de um longo tempo
para me dar conta destas expectativas depositadas sobre mim, dos outros e de
mim mesmo(a), que eu achava, até então, que eram minhas. Achava ter controle.
Poder sobre. Mas e se eu não for bom, boa suficiente? E se eu quiser fazer
diferente? E se eu não quiser mais isto? E se eu não for da forma que pensaram?
Mas, se eu fizer, vou ter que carregar isto comigo, sozinho(a)?
O
conflito interno. Uma realidade para todo ser humano. E como dizia Sigmund
Freud, somos seres em conflito, ora interno, ora externo...quem sabe os dois ao
mesmo tempo.
E
não tem jeito?
Bert
Hellinger apontava: “A paz começa onde cada um de nós pode ser da forma que é,
onde cada um de nós permite ao outro ser tal como é e ficar onde está”. Sem
acréscimos, melhorias, certos ou errado, bom ou mau, sem mudanças...a não ser a
nossa própria. Nos avaliamos, observamos, adaptamos, fazemos concessões,
renúncias, negociamos, comunicamos, trocamos com nossos pares. Nos modelamos.
Nos flexibilizamos. Conscientemente.
Tornamo-nos
adultos e “pagamos o preço”. Assumimos as consequências e tomamos consciência
de nosso lugar e possibilidades neste curso da vida. Talvez, da “nossa” vida.
As ilusões continuarão existindo. Assim como as expectativas, do outro, de mim
mesmo(a). Por vezes tudo junto e misturado. Emaranhado. É um processo de
maturação. Maturar as ações, os
pensamentos, a visão, a postura. Um caminhar de auto conhecimento e
crescimento...que vai acontecendo enquanto seguimos...
Como
nos ensina Stephan Hausner: "Expectation is the oppositive of
Relationship". É uma escolha. Uma tomada de decisão. Sigo esperando e
criando expectativas. Ou vejo e sinto o que está à minha frente. Me permito
viver, sem nada esperar. A medida que se mostra e realiza, vou me
transfonando...
Pois
é...no final se trata “apenas” de meu nível de consciência...nestes
"pequenos" detalhes...só isso!
Seguimos!
Conscientes de nós e das paçocas em nosso dia a dia!
Referências Bibliográficas:
Publicado em 2021 como texto de coautoria por René Schubert pela Editora
Literare no livro: O fracasso é apenas aquilo que vem antes do sucesso
Relação Eu e o Outro - René
Schubert publicado no blog em janeiro de
2018 -http://reneschubert.blogspot.com/2018/01/relacao-eu-e-o-outro.html
“Do Real e do Virtual” - Coluna de René
Schubert para o Jornal Zen - Ano 15, N°173, Pag.06, São Paulo, Julho 2019
“Esperar, expectar, à
deriva...ficar...” - Coluna de René Schubert para o Jornal Zen. Edição online
de Julho, 2020: https://jornalzen.com.br/
“O que esperar do futuro?” - Live com Dr.
Jorge Forbes, organizada por Prof. Emilly Fidelix e transmitida em 05/06/2020.
Disponível no Youtube: https://youtu.be/DSuqImbNvbQ
Psicologia de Grupo e a Análise
do Ego – Sigmund Freud. Obras completas de Sigmund Freud, V.18. RJ, Imago, 1996
O mal-estar na civilização e
outros textos – Sigmund Freud (1930-1936). Cia das Letras, Edição 1, 2010
Treinamento em Saúde Sistêmica
com Stephan Hausner – Anotações de René Schubert. Agosto 2018, Valinhos. Sim à
Vida: https://simavida.com.br/
A liquidez das relações.
Fragmento de entrevista de 2011 com o sociólogo Zygmunt Bauman.
https://www.youtube.com/watch?v=aI_te8T7sRU&
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